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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

GARRAFA DE SOLIDÃO - (DIÁLOGOS)

- Quando soube que estava com uma doença incurável, jurou que lutaria desesperadamente e que nunca deixaria Madeleine.
- Engraçado, parece-me que toda pessoa quando passa, a saber, que se encontra com câncer, promete nunca se entregar.
- Você agora me fez lembrar meu falecido pai. Certa vez uma empregada que trabalhava em nossa casa, começou uma frase assim: "engraçado quando o meu pai morreu..." e o velho na mesma hora rebateu: "qual é a graça Maria?"
- Lutou como um leão durante três anos e a pobre mulher, ainda nova na flor dos vinte cinco anos, resistiu bravamente como sua fiel escudeira. A morte veio sem dó e sem piedade, sempre a carnívora assanhada.
- Imagino!
- Após passar por todos esses sofrimentos, resolveu ir à luta e então abriu esse restaurante/lanchonete aonde nos encontramos. Por falar nisso está quase na hora de fechar. Cerram as portas as vinte e uma horas e até as vinte e duas aguentam os retardatários.
- É?
- Fez do segundo andar um depósito de mantimentos e o seu lar no terceiro. Sobe e sem pestanejar liga o som. É fanática por blues, colecionando fotos artigos pôsters, adorando BBKing. Acho que criou essa mania mais para se afastar dos pretendentes, mantendo assim sua atenção continuamente nisso. Seu falecido companheiro fixou moradia em suas recordações e nunca mais dali se retirou. Sempre encontramos um licor sobre a mesinha na sala. Abre então a garrafa de solidão e aí permanece ouvindo música e bebericando na companhia de uma insônia que nunca lhe abandonou.
- Estranho, quando se olha para ela nas poucas vezes em que aparece no recinto do restaurante para ver se está tudo em ordem, a impressão que temos é que nunca conseguiremos ver a sua verdadeira face.
- Não são poucos aqueles que usam esse tipo de disfarce.
- É, tem razão. Vamos?